Tuesday, April 24, 2012

Miniconto- METAMORFOSE

METAMORFOSE
Não importava o sol abrasador que torrava os miolos. Não importava o odor terrível que emanava daqueles latões de lixo, tanto que até urubus passavam por perto usando máscaras. Mas Demétrio não se importava; lá estava todos os dias mexendo em tudo, catingando ele próprio mais que os restos ali depositados. Seu corpanzil há anos não sabia o que era a carícia das águas que não fosse da chuva. Carregava moscas pelo rosto todos os dias, como se fosse um lotação de insetos, sendo algumas também embarcadas nas orelhas. Vivia, comia e dormia na imundície, lugar mais sujo impossível. O corpo adornado de perebas já nem se importava mais. Assim foi por muitos e muitos anos. Porém um dia acordou sentindo-se estranho, muito diferente. Olhou para algumas ratazanas com segundas intenções. Estava dentuço e peludo. Tinha agora os gostos de um rato, bigodes de rato, orelhas de rato, dentes de rato, enfim, transformara-se num rato. Ao contrário do caixeiro- viajante Gregor Samsa, de Kafka, o Demétrio rato estava feliz. E assim continuou vivendo por mais alguns dias até ser comido por um gato esfomeado.

Sunday, April 22, 2012

BLECAUTE

A cidade ficou às escuras por muitas horas. Um blecaute inexplicável tomou conta de toda área urbana, provocando o caos. Acidentes de trânsito, assaltos, quebra-quebra nas lojas, estupros e outras violências. A polícia não conseguia atender nem metade dos casos, para desespero dos cidadãos. Também milhares de vampiros foram liberados dos seus caixões e saíram às ruas em busca de sangue. A desgraça só não foi maior porque todos os bares de sangue permaneceram abertos.

ENQUANTO O MARIDO NÃO CHEGA

ENQUANTO O MARIDO NÃO CHEGA
A mesa estava posta. Soube pela vizinha que o marido ficara no boteco jogando baralho e bebendo pinga. Ela na janela esperava por ele, já passava das oito e nem sinal do dito. Estava toda maquiada e perfumada, bem a fim de uns amassos. E o maridaço no boteco tomando pinga, esquecido de casa. Esperou mais meia hora e como o especial não apareceu, abriu a porta do guarda-roupa e disse para o Ricardo sair; estava na hora do show.

Miniconto- Pedreiro e Corajoso

PROFISSÃO: PEDREIRO E CORAJOSO
Gilberto Antonio, profissão: pedreiro e corajoso. Fama tinha de valente e bravo. Não tinha medo de nada, enfrentava quem ou o que viesse no braço, no tiro ou no facão. Naquela tarde trabalhava solito no mais dentro do cemitério, na construção de um jazigo. Era final de tarde e o tempo estava nublado, querendo chover. O vento fazia barulho, balançava o arvoredo. Gilberto labutava num buraco de dois metros de profundidade, assentando tijolos e assoviando. O vento batendo e Gilberto assoviando feliz. Uma lona plástica preta cobria os materiais de construção como cimento e a cal. Naquele lugar de silêncio quase absoluto, uma rajada de vento mais forte levantou a lona e a jogou sobre Gilberto. Distraído, levou um tremendo susto, escureceu tudo, pensou: “é uma alma penada querendo me levar!” Saltou para fora do buraco como um gato assustado e correu mil metros tal qual um velocista, até chegar ao hospital. Prontamente atendido, foi constatado um princípio de infarto, mas não se sabe se foi pelo esforço da corrida ou pelo cagaço.

Miniconto- SUPERSTICIOSO

SUPERSTICIOSO
Virgulino era o cão de supersticioso. Sempre levantava da cama com o pé direito e não saí de casa sem antes saber do horóscopo. Naquela manhã caminhava pela rua do comércio quando se deparou com uma escada erguida e um gato preto debaixo dela. Não pensou duas vezes: saiu da calçada e contornou pela pista. Mas levou azar o Virgulino: foi atropelado por uma carroça puxada por um burro. No hospital, com pernas e braços quebrados, ficou pensando se não era ele quem deveria estar puxando a carroça.

“A grande função da leitura é libertar o homem de mitos e superstições.”(Janer Cristaldo)

Monday, March 26, 2012

Poeminha- Se eu fosse um poeta

Se eu fosse um poeta,
escreveria em pétalas de rosas
uma poesia pra você.
Mas destituído de talento,
só me resta mandar esta carta simples
nesta folha sem graça,
escrita em letra de forma, 
dizendo que estou derretido 
e mais um pouco pela sua pessoinha.

Sunday, March 25, 2012

“Sou mais um desiludido com a política praticada em meu país. Politicamente estou órfão.”

“Alguns seres menores só nos reconhecem quando precisam de ajuda. Sem isso, nos viram o rosto.”

“A vida de qualquer um daria um livro. É claro que alguns seriam indicados como soníferos.”

“O idiotas fundamentalistas estão mesmo tomando conta do mundo. Se depender deles, dentro de pouco só teremos para ler bulas de remédios."

A MINHA VERDADE


A MINHA VERDADE

Procurei a verdade sobre o lugar final do caminho sem retorno.
Porém na busca apenas colecionei mentiras e aproveitadores sem fim.
Quando então, convicto do nada,
Decidi apenas amar e seguir o caminho da vida,
Tirei um enorme peso dos ombros e consegui ser feliz.

Morre o escritor italiano Antonio Tabucchi

O escritor italiano Antonio Tabucchi faleceu em Lisboa aos 68 anos após uma longa doença, informou neste domingo o tradutor de sua obra para o francês, Bernard Comment. Considerado um dos maiores autores italianos contemporâneos, Tabucchi escreveu obras como Afirma Pereira e O Tempo Envelhece Depressa. Autor de mais de 20 livros traduzidos para quase 40 idiomas, o romancista, professor universitário e ensaísta era tradutor da obra do escritor português Fernando Pessoa para o italiano e um de seus principais divulgadores.

Monday, February 20, 2012

Poeminha

CORRIDA
Corra
Corra menino
Corra menino na busca do saber
Senão restará para você
Ser apenas mais um zero
No mundo dos nadas.

Friday, February 10, 2012

Poeminha- Gaiola

GAIOLA

Gaiola não é hotel.
Por mais que o serviço seja bom, falta o principal:
A liberdade só conseguida nos céus.
Homens, abram as portinholas e consintam aos pássaros
O direito de viver sem limites.

Thursday, February 09, 2012

Miniconto- Intranquilo

INTRANQUILO
Ele saiu de casa naquela tarde completamente intranquilo, estando seu cérebro em chamas. Repetia para si: “hoje eu mato alguém, hoje eu mato alguém.” Deixou o automóvel na garagem e seguiu caminhando em direção à cidade. Na cabeça usava um boné branco e na mão direita um revólver calibre 38, carregado com cinco projéteis. No caminho cumprimentou bodes e galinhas, patos não havia. Duas centenas de metros antes da cidade ele empacou. Sentou-se numa pedra e ficou por alguns minutos pensativo, até mesmo sem cuspir. Então deu um grito pavoroso  que acordou os japoneses, esbugalhou os olhos e atirou na própria cabeça. Em casa, sua mulher sentiu o coração palpitar quando viu os comprimidos do marido doente jogados no lixo.

POEMINHA- CERTEZA

CERTEZA
A vida corre
A morte nos espera
Somos ínfimas partículas
Filhas longínquas da grande explosão
Então mesmo sabendo
O que nos aguarda no fim
Vivemos com pressa
Como se a morte
Fedorenta e fria
Não fosse nos esperar.

POEMINHA- LOUCURA

LOUCURA

Vivemos dentro sociedade uma tempestade de
Drogas
Pressa
Trânsito maluco
Desamor
Interesses
Crueldade
Corrupção
Desconfiança
Stress
Depressão
O melhor a fazer é desligar o motor do mundo
E criar o seu próprio modo de viver.

POEMINHA- RECADO


RECADO
Querida,
receba o meu coração através desta andorinha.
Vai embrulhado em papel pardo.
Faça dele o que quiser,
pois morto já estou.
PS: Morri de saudade.

POEMINHA- O CIRCO


O CIRCO

Era um circo pobrezinho,
De parcos recursos e lonas rasgadas.
Não tinha animais em jaulas, nem mesmo um velho leão.
Sobrevivia de espetáculos de lutas e palhaçadas,
Mas era um circo alegre.
Porém um dia o circo pobre
Além de pobre ficou triste:
Seu artista principal foi morto num bordel.
Meus olhinhos de criança
Viram quando saiu o cortejo,
Acompanhado por dois palhaços
E nenhuma multidão.