Tuesday, April 23, 2013

NO CHÃO

NO CHÃO
Estando parado eu não me encontro
Andando ainda menos
Então eu caio e fico inerte como um defunto
Esperando talvez pelo pranto de uns poucos
Falso morto
Às vezes pisco os olhos
Para espantar os urubus.

BAÚ


BAÚ
Abri um velho baú
Cheio de rasgos e pó
Tirei dele uma velha carta de amor
Daquelas amareladas pelo tempo
Ao abri-la senti o calor
Do abraço da saudade
Mas ao lê-la percebi
Que os nossos sonhos são temporais
E que não sobrevivem à realidade da vida.

Thursday, April 18, 2013

VIVER


VIVER
Viver...
Viver é se importar
É colocar o coração na estrada.
Viver é olhar em volta
E observar se alguém está chorando.
Viver é saber
Que o ser humano não pode ser apenas estatística.
Viver é procurar ser justo
E ter sempre uma palavra de carinho na dor de outrem.
Viver é aprender a cada dia
Uma nova lição.


A POMBA DA DONA CLONI E OS GAFANHOTOS


Uma nuvem negra se formou no horizonte e vinha na direção das plantações de milho do seu Anacleto. Mas não era chuva que se aproximava, mas sim uma nuvem de gafanhotos com milhões de gafanhotos famintos. Seu Anacleto coçou a cabeça pensando no que faria para espantar tantos bichos. Ai meu milho! Ele não usava pesticida, teria que ser de outro jeito. Os danados estavam chegando, precisava pensar rápido. Mandou então chamar sua esposa, e para espanto de todos disse para ela ficar nua no meio da plantação. Dona Cloni ficou um pouco contrariada, mas foi no pelo para dentro do milharal. A nuvem de gafanhotos fez menção de atacar, mas seguiu em frente, não parou. O agricultor sorriu feliz, tinha acertado. Dona Cloni queria saber então o porquê de mandar ela para dentro do milharal.  Disse ele:
- Ora mulher, é tudo uma questão de lógica. Como você não é muito chegada a tomar banho, mal que te acomete há anos, o cheiro da tua pomba já matou um pinto, que por sinal foi o meu. Deduzi então que se o cheiro da tua pomba matou um pinto, como não mataria gafanhotos que são bem menores?

Wednesday, April 17, 2013

“Embarquei minha saudade nas asas de um passarinho. Lá vai ela visitar você.” (Mim)

VOA


VOA

Abri a torneira do meu pocinho de lágrimas
Para chorar de saudade de você
Mas é um choro bom
Que só revela a grandeza deste sentimento
E canto
Voa meu passarinho
Voa
Vai fazer teu ninho
Mas não se esqueça
Que sempre estarei aqui
Pronto para te aconchegar sob minhas asas.

EXEMPLAR


EXEMPLAR

Até os trinta anos Vitor viveu por conta dos pais. Eles mortos resolveu procurar emprego. Conseguiu de vigia diurno numa grande empresa de pneus. Trabalhou bem os primeiros sete dias. No oitavo dia tirou folga por conta própria. No nono dia pediu um vale pela manhã e adiantamento de férias pela tarde. No décimo dia chegou à conclusão que trabalhar era cansativo. No décimo primeiro saiu do emprego e foi atrás de criar um sindicato. Ufa!

CANSOU DE SER GENTE


CANSOU DE SER GENTE

Naquele dia Arnaldo estava se sentindo um traste. O céu era marrom, a saliva tinha fel. Queria um abismo só para chamar de seu. Chegou em casa e foi direto para o canil. Mandou o Duque para dentro da residência se deitou na morada do cão. Espreguiçou-se, lambeu os beiços e passou a roer um osso. Antes da meia-noite já estava latindo para os passantes.

A BARATA


A BARATA

Roberto dormia nu enquanto uma barata passeava sobre seu corpo. Ainda sonolento sentiu o toque do bicho nojento na sua pele. Mandou um tapa daqueles do vivente trocar de orelhas. Errou do bicho e acertou em cheio o próprio saco. Caiu da cama desmaiado de tanta dor. A barata ainda ria quando o corpo dele tombou sobre ela. Ploc! Ponto para nós.

CHAPEUZINHO PT


CHAPEUZINHO PT
Era uma vez uma menininha chamada Chapeuzinho PT. Morava próxima da mansão da vovó e toda semana a visitava. Nas conversas com a vovó ficava metendo o pau Lobo Mau; também na escola, nos jornais, na televisão. O Lobo Mau era então o mal do mundo. Passado algum tempo a vovó morreu e Chapeuzinho herdou sua mansão e terras. E sabe quem ela foi buscar no Maranhão para ajudá-la administrar a herança? Pois é, o Lobo Mau.

O LENÇO


O LENÇO

Todo pessoal do escritório foi convidado para a festa de aniversário do Joel. Coisa simples, um arroz com galinha para a data não passar em branco. João comeu que se fartou e bebeu três copos de vinho. Lá pelas tantas sentiu um nó nas tripas e correu para fora à procura de um banheiro. O banheiro era uma casinha de madeira no fundo do lote, que se chegava por um carreirinho de pedras. João entrou correndo para se desapertar. Não havia luz, e pior, terminado o serviço não havia papel. E agora? Sair com a bunda suja não dava. João lembrou que trazia no bolso da calça um daqueles lenços que mais parecia um lençol de tão grande. Passou o lenço no rego, dobrou direitinho e na saída jogou o tal num canto entre folhagens. Passados alguns do jantar comemorativo, uma gripe danada passou pelo escritório pegando todo mundo. E não foi outro senão o próprio João que observou quando o colega Joel sacou o lenço abandonado entre as folhagens e assuou o nariz.

TREINAMENTO


TREINAMENTO

Tarde de sábado. Sol quente, pouco movimento pelas ruas. Vera Lucia estava deitada sobre tábuas no porão aberto e fresco da grande marcenaria. Saia levantada, calcinha de lado e treinando o revezamento de vizinhos, no caso seis por um. Quando todos os atletas treinaram, ela foi embora satisfeita, mas com a perereca ardida.

SONHOS


Eu sonho
E sonho sonhos tão meus
Mas ao realizar meus sonhos
Meu povo amado
Quero realizar também os sonhos teus.

Monday, February 04, 2013

NAUPATIA

NAUPATIA

Estou em viagem pelo Caribe
Almoço ao lado do comandante
O balanço do navio me traz naupatia
Chamo pela mãe, vó e tia
Naupatia
Não tem jeito
Vomito no colo do comandante.

DESESPERADOS


DESESPERADOS
Uma multidão corria pelas ruas em pranto. O desespero era visível nos olhos e expressões dos famintos por paz. Mulheres e homens jogavam-se ao chão asfáltico raspando os rostos no solo íngreme que causava ferimentos dolorosos. Meninotas e meninotes também faziam parte da turba de tresloucados. Povo fugindo da guerra? Terremoto? Não! Derrota futebolística.

MINHA CAMISA DE NANZUQUE


MINHA CAMISA DE NANZUQUE

Foi numa tarde quente de sábado
Vesti minha camisa nova de nanzuque e saí à rua todo pachola
Parei na esquina para tomar sorvete
O sorvete derreteu depressa e manchou minha camisa de nanzuque
Voltei para casa
Fui ao tanque
Exagerei nos produtos de limpeza
E disse adeus à minha camisa de nanzuque.

Monday, January 28, 2013

O PERFEITO AVARENTO


O PERFEITO AVARENTO

Uma carta anônima recebida pelo Promotor Público Roberval Sintra levantou suspeita de envenenamento na morte do senhor Demóstenes Sotero, fazendeiro mais conhecido na sua cidade como o “perfeito avarento”. Homem de muitas posses, sua viagem sem retorno seria interessante para muitos parentes, mas não foi. Esperavam pela herança que não veio. Fez doação de todos os seus bens para suas amantes. Aos parentes, nada. O juiz Carlos Raul então determinou que o corpo fosse desenterrado para nova perícia. Cidade pequena, grande assunto. O povo, sempre curioso, invadiu o cemitério. Até parecia quermesse paroquial.  Não faltaram vendedores de garapa, picolé e milho verde; moças de vestidos novos e lábios vermelhos. Quando foi aberto o caixão, surpresa para todos: O corpo estava deitado de lado, a língua de fora, como se estivesse assim para molhar os dedos e contar dinheiro. Em suas mãos havia milhares de reais em notas mofadas e puídas. Moedas de ouro pularam dos bolsos quando mexeram com ele. Alguns parentes, espichando os olhos, contavam com tristeza a pequena fortuna que poderia ser deles. Alguns até choraram. Porém nada foi constatado e o assunto foi encerrado. Passado alguns anos, só os parentes em suas conversas reservadas, lembram ainda com saudade doída daquelas notas, daquelas moedas...

Saturday, January 26, 2013

É PRECISO DUVIDAR


É PRECISO DUVIDAR

Quem não duvida
Engole o pronto
Gosto é gosto
Não se discute
Absorvido o pronto
O pensar não repercute
Morre no ser que o recebeu
Como verdade absoluta.

PODER


PODER
O poder se assenta sobre a mentira
Mentira dita
Mentira repetida
Mentira que se torna verdade
Propaganda é a alma
Faz o povo se sentir num virtual paraíso
Não é fácil aceitar tudo isso
Pois quando eles chegam lá
Pegam gosto pela coisa
E não querem mais tirar os beiços da teta
O poder causa grandes comichões
E fantásticas comissões.

URNA

URNA

Entra o voto
No Celso ou no Otto
Às vezes também muda o traje e a foto
Porém no sistema miau nada muda
Isso eu bem noto.

CIRROSE

CIRROSE

No embalo de todo os dias
À embriaguez ele não renuncia
O corpo abre os olhos
Já pedindo glicose
Ou mesmo uma nova dose
Enquanto pacientemente espera pela cirrose.

MOTOARMA

MOTOARMA

Morteciclista
Arma na mão
O capacete esconde o rosto
Sua arma mostra o coração.

Friday, January 25, 2013

POEMINHA

LADRÃO
Tem um ladrão na sala
De diversas polegadas
Fica por horas roubando o seu tempo
Normalmente sem nada a acrescentar
Enquanto os bons companheiros
Apanham poeira na estante.

Thursday, January 24, 2013

ESTRESSADO

ESTRESSADO

O guarda - rodoviário Nestor não estava num bom dia. Talvez fosse pela noite mal-dormida, pelos problemas de saúde da mulher, ou pela insatisfação salarial que sentia. Há meses que suas noite eram atormentadas pela insônia, nem mesmo os medicamentos o ajudavam. Preocupações demais, sono de menos.
As horas se passavam pesadas e cansativas nesse dia cinzento que anunciava chuva. Quando teve que parar um motorista que voava baixo pelo asfalto, Nestor não pensou duas vezes antes de agir. Aproximou-se e tirou o sujeito do automóvel a tapas, ainda fez ele se despir e correr nu pela estrada. Puro abuso de autoridade. Depois disso atirou nos pneus do veículo e foi para casa bocejando.

POEMINHA

ESTÁS DENTRO?
O obstruído mental bebe sua cerveja/iogurte/refrigerante enquanto dirige
Então atira o vasilhame no asfalto.
Nada se compara a ser energúmeno e porco.

POEMINHA


LUTO

Apaga-se a própria vida
Pela dor da ausência
Vive-se mais o morto
Que os vivos nas cercanias
Não existe luta contra o luto
Apenas cobre o coração com ele.

POEMINHA


TEMPORAL

Nuvens baixas
Ventos quentes
Escuridão que amedronta

Ele adentra ao porão
E faz seu refúgio
Sob uma velha mesa.

O temporal uiva e assopra
Enquanto o coração do pequeno
Explode de medo e sai pela boca.

Friday, January 18, 2013

PARA QUEM DITA AS DORES

“Ó ditadores de todos os matizes que ostentam brilhantes medalhas imerecidas, comendas e adjetivos superlativos; vós que sois usurpadores da liberdade de pensar diferente e do direito de ir e vir; vós fedeis mais que matéria fecal e confesso que tenho pena dos vermes que um dia comerão vossas carnes, pois restarão para eles apenas a indigestão e vômito.”(Filosofeno)

ESPERANÇA


ESPERANÇA
Formigas caminham pela varanda completamente despreocupadas enquanto um cão preguiçoso boceja deitado satisfeito na cerâmica fria. Nuvens passeiam pelo céu, sem pressa. O sol vespertino é forte; o verde das árvores se destaca; o cantar dos pássaros presos é triste. Alados libertos cruzam os ares fazendo alarido e lamentando a má-sorte dos irmãos engaiolados. Não tem jeito, quem está na gaiola canta de tristeza, mas os obtusos pensam que é de alegria. Quem canta seus males espanta; eles sabem disso mais do que ninguém. Uns poucos ainda olham para cima com esperança de um dia poder novamente voar. A esperança, sempre ela, junto do ser até o derradeiro suspiro.

ABISMO

ABISMO

Há uma porta aberta no fim do corredor. O ambiente é convidativo, a energia do grupo contagia os novos chegados; cânticos e louvores são ouvidos e inflamam corações. A maioria dos presentes passa pela porta ciente que é dono da verdade futurista. Por livre vontade caem então no abismo da exploração do qual poucos voltam. Os louvores e valores continuam.

Monday, November 26, 2012

O RELÓGIO


O RELÓGIO
Jarbas e Jardel brincando no bosque encontraram um relógio, o relógio do tempo. Cheios de curiosidade foram mexendo nele, descobrindo seus mecanismos. Fizeram-no então parar e descobriram em poucos dias que o tempo não mais existia para eles. Jogaram então o relógio do tempo num abismo e foram viver eternamente suas vidas como crianças.

PROFISSÃO MENDIGO

PROFISSÃO MENDIGO
É pouco depois da hora de almoço. Homem maltrapilho está deitado no banco da praça, descansando, suado e atraindo moscas. Ninguém o vê, todos passam sem notá-lo. Antes das duas da tarde ele fica em pé e caminha até a esquina. Senta-se na calçada e estende o boné para angariar esmolas. Assim passa o resto do dia. Quando os sinos da catedral batem seis horas ele recoloca o boné na cabeça. Logo surge um Corolla preto, o motorista desce e pergunta para ele:
-Vamos patrão?

Saturday, November 03, 2012

Apertando os olhos


APERTANDO OS OLHOS

Tarde amena. O homem olhava pela janela do apartamento que visitava interessado em comprar. Estava ele no décimo andar. Observava no prédio vizinho uma mulher que se despia em frente ao espelho. Logo surgiu um jovem que começou a beijá-la sem parar. Cheio de curiosidade continuou olhando para ver no que dava. Deitaram-se na cama, ele ainda vestido. Resolveu ligar para sua mulher para contar o que estava acontecendo. A mulher pelada largou o jovem e apanhou na bolsa o celular que tocava. Foi aí que ele franziu o cenho e apertou os olhos para tentar enxergar com maior clareza quem era ela.

Thursday, October 25, 2012

O VOO


O VOO
Tomas dormia durante o voo. A aeronave estava em velocidade de cruzeiro quando ele acordou. Após olhar detalhadamente em volta percebeu algo estranho. Naquele voo pareciam estar reunidas inúmeras pessoas famosas já falecidas. Ao seu lado, por exemplo, estava um passageiro que era sósia do Mahatma Ghandi. Do outro lado do corredor viu com clareza Airton Senna gargalhando ao brincar com amigos. Alguma coisa diferente acontecia. Quando foi ao banheiro deu de frente com uma pessoa muito conhecida aos católicos, o Papa João Paulo II, que pelo dizeres do crachá era o co-piloto do avião. Quando Madre Tereza de Calcutá, uniformizada de aeromoça passou com o carrinho de lanche pelo corredor, Tomas ficou pálido e perguntou ao senhor ao lado o que estava acontecendo naquele avião. O ancião olhou rindo para ele e respondeu:
- Acorde tonto, você está sonhando.



SOB A MARQUISE


SOB A MARQUISE
A chuva caía forte na tarde. Saí do banco desprotegido então parei sob uma marquise. Logo estávamos em mais de dez, entre mulheres e homens. Tentei puxar conversa para passar o tempo enquanto descia o aguaceiro. Todos usavam máscaras de carranca e não queriam papo, absorvidos em suas complicadas vidas. Fiquei na minha, pensando em coisas boas que ainda teria no dia, como visitar minha mãe e comer pão caseiro da hora. Não demorou e meu motorista chegou, deixando todos ali perplexos. Embarquei no meu Rolls Royce sob abanos tímidos e sorrisos falsos dos companheiros de marquise.

Sunday, October 21, 2012

Poeminha


OBEDEÇO
Manda-me partir
Assim sem mais nem menos
Ainda nesta noite
Muito te amo ingrata
Porém não te peço arrego
Parto
Parto dividido
Uma parte de mim queria ficar
Mas meu amor próprio falou
Vá!

Miniconto- Falhou

FALHOU
O esquisitóide violento entrou no quadrado de madeira de arma em punho. Na cama viu um bípede peludo dançando ritmado sobre sua fêmea que suspirava alto. Tentou disparar os projéteis por seis vezes e nada. Falhas repetidas.  Irado, tentou contra sua própria cabeça, aí então funcionou e ele caiu morto. Os amantes ainda na cama marcaram a data de casamento.

Friday, October 19, 2012

O MANDÃO


O MANDÃO
História antiga da cidade de Barro Preto. Contam os velhos que havia na cidade um homem brabo que só o cão, o Coronel Artur Cerejeira. Mandava e desmandava, botava e tirava. Era diferente dos outros, não mandava matar, matava. Os cachorros perdidos faziam voltas para não encontrá-lo. Nem morrer ninguém morria sem ele mandar. Nem o vento soprava sem ele dar autorização. Certa feita o jovem Nicolau, na flor dos dezoito anos morreu de repente, doença não sabida. O Coronel ficou sabendo e foi ao velório já fulo da vida. Entrou, mandou parar com a choradeira e ordenou que o defunto se levantasse do caixão. Pois foi que o defunto se levantou  e saiu correndo. Nunca mais foi visto, dizem que só parou de correr em São Paulo. O povo que lá estava jura que é verdade. Vai saber...

SURUBA PAROQUIAL


SURUBA PAROQUIAL
Naquela tarde de sábado resolvi visitar meu amigo Severino que há muito eu não via. Cheguei à sua residência, bati algumas vezes e ninguém atendeu. Pousei a mão no trinco e hesitei. Vindo de dentro da casa ouvi gemidos. Chovia, olhei em volta e não nenhuma alma para me acompanhar. Forcei o trinco e percebi que a porta estava aberta. A casa estava às escuras, fui entrando devagar, passos miúdos e leves para não fazer ruídos. Na parte de baixo não encontrei ninguém, tudo em ordem. Novamente ouvi gemidos vindos do segundo piso. Subi as escadas e entrei na primeira porta que estava aberta. Visão do inferno. Lá estava Severino, pelado e algemado na cama, levando uma surra de chicote da Irmã Cacilda, também nua e usando botas de cano longo. Apavorado, fui saindo e fechando a porta devagar, foi quando ainda pude ver o pequeno guarda-roupa desabar e sair de dentro dele o padre Malaquias nuzinho e com um vibrador na mão.

Thursday, October 18, 2012

Poeminha- Vi tua foto no Face


Poeminha- Vi tua foto no Face

Depois de tantos anos sem te ver
Vi tua foto no Face
Estremeci
E foi o que bastou pra saudade bater
Para meu coração entrar em descompasso
E querer de novo o teu abraço
Sem demora
É só tu querer.


Wednesday, October 17, 2012

Não acontece nada


NÃO ACONTECE NADA
O sol está radiante. Uma borboleta da voltas e pousa na rosa. Maria arruma os longos cabelos e senta-se num banco do parque. O vento sopra. Uma folha morta despenca da árvore. Formigas apressadas entram no formigueiro. Crianças fazem alarido pelo gramado bem cuidado enquanto seus pais montam guarda. O vendedor de picolé limpa o suor do rosto com uma toalha branca sem mancha. Rugas verdes enchem suas pancinhas de folhas jovens. No céu azul, nuvens passeiam, de vez em quando ganhando sustos de aviões enormes. Um casal de namorado briga, outro troca carícias. Ao longe, na estrada, centenas de automóveis se empurram em busca de espaço. Um magrelo anda por ali montado em sua magrela. Um senhor careca passeia e contrasta com seu cão peludo. Pássaros gorjeiam, e quem ouve com o coração aplaude. Pois é, a vida chata, não acontece nada.

O Assalto


O ASSALTO
Era quase meio dia.  A porta foi do escritório foi forçada e dois homens entraram de armas em punho. O mais alto gritou: É um assalto, todos para o chão! Severino sem tirar os olhos do texto que estava digitando berrou: Então entra de uma vez seu filho da puta, fecha essa porta que está entrando um vento frio, não quero pegar um resfriado!   O bandido mais alto tirou os óculos escuros e fez menção de atirar, mas ao ver quem era apenas balbuciou... papai. Pediu sua bênção e foi assaltar o escritório ao lado.

Monday, October 15, 2012

Miniconto- Chamando Maria


CHAMANDO MARIA
O copo está  na mesa cheio de aguardente. Honório vê figuras duplas nos quadros pendurados, vê também o copo em duplicidade, talvez pensando que o conteúdo também seja duplo. Arrasta os chinelos, bate o joelho direito no canto do sofá, mas anestesiado pelo álcool não sente dor. Tanta cantar uma velha canção e a baba escorre, as palavras saem tortas. Seus olhos estão em brasa, seu hálito é fétido. Agora quer comer. Chama pela esposa Maria, que não vem. Xinga Maria de vaca velha, Maria não responde. Não contente, começa a quebra pratos e copos, atirando-os na parece. Chama Maria novamente, chamado que novamente não é correspondido. Derruba então a cristaleira e quebra as cadeiras no tampo da mesa. Um alvoroço. Chama Maria de cadela sarnenta e Maria então vem... Vem, mas não vem só, traz consigo um porrete de aroeira e manda a borduna sem dó. O destemido cai de quatro tastaviando à procura da porta de saída. Quer ir rumo ao deus dará. Antes de ganhar a rua já tem duas costelas quebradas e uma orelha caída. Fora da casa quis ficar em pé, porém uma porretada no joelho o deixou sem reação. Entregou-se. Para não apanhar mais prometeu comprar novos móveis e utensílios sem reclamar. E a  chamar Maria de meu bem.

Thursday, October 11, 2012

Miniconto- MON


MON
Mon está sentado na beira do abismo. Suas pernas balançam no ar chutando bolas invisíveis. Não se encontra mais consigo mesmo, é o dia de maior desespero. Olha para suas mãos calejadas, suas unhas sujas de terra e grita silenciosamente se tudo que fez valeu à pena. Retira do bolso da camisa e relê o telegrama que trouxe a notícia da morte de seu filho único. O punhal é cravado de novo, mais fundo. Não suporta. Basta. Deixa seu corpo pesado cair no abismo em busca da leveza da vida sem dor.

Wednesday, October 10, 2012

Miniconto- Solidários, mas não muito


SOLIDÁRIOS, MAS NÃO MUITO

Na segunda metade do século XXI uma grande epidemia dizimou metade do povo brasileiro. Nas pequenas vilas do nordeste em que a ajuda não chegou a tempo, os mortos dormiam nas ruas. Sem comida e sem remédios o povo fugia desesperado levando apenas algumas roupas...  

Saídos de uma pequena cidade do interior do Brasil vinte casais em fuga caminharam por mais de cinco mil quilômetros em busca de um lugar seguro para ficar. Unidos, todos se ajudaram nos momentos difíceis de enfermidades e fome. Repartiam bolachas e grãos de feijão. Nas horas de desespero e abandono um casal apoiava o outro, solidários e cheios de afeto. Enfrentaram juntos temporais e o pranto de saudade dos queridos mortos. Diante da desgraça pareciam irmãos de sangue. Aconteceu então o dia que a vintena de desterrados entrou numa fazenda abandonada e além de cadáveres por todos os lados encontrou uma maleta com mais de R$ 2 milhões de reais abandonada num canto. Enterraram os mortos e descansaram...

Planejaram que quando estivessem em um lugar definitivo dividiriam o montante em partes iguais. Foram dormir felizes com a esperança de um amanhã melhor. Durante a noite enquanto todos os demais dormiam o casal Marcoloto, com pés de pano, partiu levando o pequeno tesouro da comunidade. Quando acordaram e perceberam o insulto, ninguém reclamou. Contavam-se felizes por estarem todos livres da doença. Na vida não se pode ter de tudo.

Tuesday, October 09, 2012

Miniconto- Pesadelo


PESADELO
Acordo do meu pesadelo todo suado. Acendo a luz e bebo um gole d’água. Olho em volta ainda assustado. No meu sonho caio de uma sacada no colo do diabo. Mas pesando 140 quilos não dei chance ao capeta e o arrebentei todo. No chão, arfando irado e com os chifres quebrados ele deu o último suspiro dizendo:
- Elefante besta morando em apartamento...

Wednesday, October 03, 2012

Miniconto- Dia ruim

DIA RUIM

Ele acordou dentro do ataúde fechado. Acendeu a lâmpada e viu que relógio havia parado. Droga de relógio falsificado! Ninguém mandou fazer economia, ralhou consigo mesmo. Que horas serão? Dia ou noite? Apanhou uma bala de hortelã para dar um lustro no bafo, que estava horrível. Bateu o pó do smoking, fechou os botões e foi abrindo a tampa do caixão bem devagar. Percebeu que era noite e respirou aliviado. Foi à geladeira e tomou seu diário copo de sangue. Porra! Sangue azedo. Cuspiu diversas vezes querendo tirar o gosto, mas por azar cuspiu em cima do sapato novo. Irado, transformou-se em morcego e saiu batendo asas rumo ao Banco de Sangue em busca do desjejum.
- Está uma merda ser vampiro!

Sunday, September 30, 2012

Medo da morte

"Por que temes morrer? Medo do fogo, temor da escuridão sem fim? Uma mentira repetida bilhões de vezes a torna verdade? O inferno é a consciência atormentada pelo remorso. Corpo morto, não há trevas, não há fogo, não há paraíso, somente o nada, a paz de dormir sem acordar, sem pesadelos. É duro saber que não voltaremos e que não teremos ninguém nos esperando do outro lado, que não existe o outro lado, somente o lado de cá, dos vivos e também dos mais vivos, que estão por aí a vender uma mercadoria que jamais entregarão."
(FILOSOFENO, o filósofo que dorme sobre o capim)

Saturday, September 29, 2012

Miniconto- Carniça


CARNIÇA
O urubu percebeu um corpo inerte estendido na areia do deserto. Fez o reconhecimento e pousou o sobre o cadáver. Deu a primeira bicada, engoliu, sentiu náuseas e foi então que percebeu que o corpo que devorava pertencia a um general nazista carregado de medalhas. Fez cara de nojo e esbravejou: putz!

Miniconto- Não era meu parente

NÃO ERA MEU PARENTE
O sol se põe e há um homem morto caído no meio da rua. A multidão se aglomera para ver o cadáver. O povo gosta mesmo de ver a desgraça dos outros. Não existe sangue no asfalto, apenas um leve filete saindo do nariz do pobre. Uma bicicleta torta atirada ao lado já diz tudo. A mulher de blusa vermelha olha bem de perto para ver se não é um primo seu. O homem de camiseta amarela e boné branco também chega bem perto para ver se o reconhece. Nada. Vem o perito, faz os procedimentos e o leva embora. O atropelador, em casa, sossegado, toma mais uma cerveja. Dias depois, descoberto pela lei e questionado o porquê de não ter prestado socorro, diz: “Que importa? Não era meu parente”.

“No meu caminho havia um padre. Havia um padre no meio do meu caminho e depois na minha cama.” (Josefina Prestes)

Tuesday, April 24, 2012

Miniconto- METAMORFOSE

METAMORFOSE
Não importava o sol abrasador que torrava os miolos. Não importava o odor terrível que emanava daqueles latões de lixo, tanto que até urubus passavam por perto usando máscaras. Mas Demétrio não se importava; lá estava todos os dias mexendo em tudo, catingando ele próprio mais que os restos ali depositados. Seu corpanzil há anos não sabia o que era a carícia das águas que não fosse da chuva. Carregava moscas pelo rosto todos os dias, como se fosse um lotação de insetos, sendo algumas também embarcadas nas orelhas. Vivia, comia e dormia na imundície, lugar mais sujo impossível. O corpo adornado de perebas já nem se importava mais. Assim foi por muitos e muitos anos. Porém um dia acordou sentindo-se estranho, muito diferente. Olhou para algumas ratazanas com segundas intenções. Estava dentuço e peludo. Tinha agora os gostos de um rato, bigodes de rato, orelhas de rato, dentes de rato, enfim, transformara-se num rato. Ao contrário do caixeiro- viajante Gregor Samsa, de Kafka, o Demétrio rato estava feliz. E assim continuou vivendo por mais alguns dias até ser comido por um gato esfomeado.

Sunday, April 22, 2012

BLECAUTE

A cidade ficou às escuras por muitas horas. Um blecaute inexplicável tomou conta de toda área urbana, provocando o caos. Acidentes de trânsito, assaltos, quebra-quebra nas lojas, estupros e outras violências. A polícia não conseguia atender nem metade dos casos, para desespero dos cidadãos. Também milhares de vampiros foram liberados dos seus caixões e saíram às ruas em busca de sangue. A desgraça só não foi maior porque todos os bares de sangue permaneceram abertos.

ENQUANTO O MARIDO NÃO CHEGA

ENQUANTO O MARIDO NÃO CHEGA
A mesa estava posta. Soube pela vizinha que o marido ficara no boteco jogando baralho e bebendo pinga. Ela na janela esperava por ele, já passava das oito e nem sinal do dito. Estava toda maquiada e perfumada, bem a fim de uns amassos. E o maridaço no boteco tomando pinga, esquecido de casa. Esperou mais meia hora e como o especial não apareceu, abriu a porta do guarda-roupa e disse para o Ricardo sair; estava na hora do show.

Miniconto- Pedreiro e Corajoso

PROFISSÃO: PEDREIRO E CORAJOSO
Gilberto Antonio, profissão: pedreiro e corajoso. Fama tinha de valente e bravo. Não tinha medo de nada, enfrentava quem ou o que viesse no braço, no tiro ou no facão. Naquela tarde trabalhava solito no mais dentro do cemitério, na construção de um jazigo. Era final de tarde e o tempo estava nublado, querendo chover. O vento fazia barulho, balançava o arvoredo. Gilberto labutava num buraco de dois metros de profundidade, assentando tijolos e assoviando. O vento batendo e Gilberto assoviando feliz. Uma lona plástica preta cobria os materiais de construção como cimento e a cal. Naquele lugar de silêncio quase absoluto, uma rajada de vento mais forte levantou a lona e a jogou sobre Gilberto. Distraído, levou um tremendo susto, escureceu tudo, pensou: “é uma alma penada querendo me levar!” Saltou para fora do buraco como um gato assustado e correu mil metros tal qual um velocista, até chegar ao hospital. Prontamente atendido, foi constatado um princípio de infarto, mas não se sabe se foi pelo esforço da corrida ou pelo cagaço.

Miniconto- SUPERSTICIOSO

SUPERSTICIOSO
Virgulino era o cão de supersticioso. Sempre levantava da cama com o pé direito e não saí de casa sem antes saber do horóscopo. Naquela manhã caminhava pela rua do comércio quando se deparou com uma escada erguida e um gato preto debaixo dela. Não pensou duas vezes: saiu da calçada e contornou pela pista. Mas levou azar o Virgulino: foi atropelado por uma carroça puxada por um burro. No hospital, com pernas e braços quebrados, ficou pensando se não era ele quem deveria estar puxando a carroça.

“A grande função da leitura é libertar o homem de mitos e superstições.”(Janer Cristaldo)

Monday, March 26, 2012

Poeminha- Se eu fosse um poeta

Se eu fosse um poeta,
escreveria em pétalas de rosas
uma poesia pra você.
Mas destituído de talento,
só me resta mandar esta carta simples
nesta folha sem graça,
escrita em letra de forma, 
dizendo que estou derretido 
e mais um pouco pela sua pessoinha.

Sunday, March 25, 2012

“Sou mais um desiludido com a política praticada em meu país. Politicamente estou órfão.”

“Alguns seres menores só nos reconhecem quando precisam de ajuda. Sem isso, nos viram o rosto.”

“A vida de qualquer um daria um livro. É claro que alguns seriam indicados como soníferos.”

“O idiotas fundamentalistas estão mesmo tomando conta do mundo. Se depender deles, dentro de pouco só teremos para ler bulas de remédios."

A MINHA VERDADE


A MINHA VERDADE

Procurei a verdade sobre o lugar final do caminho sem retorno.
Porém na busca apenas colecionei mentiras e aproveitadores sem fim.
Quando então, convicto do nada,
Decidi apenas amar e seguir o caminho da vida,
Tirei um enorme peso dos ombros e consegui ser feliz.

Morre o escritor italiano Antonio Tabucchi

O escritor italiano Antonio Tabucchi faleceu em Lisboa aos 68 anos após uma longa doença, informou neste domingo o tradutor de sua obra para o francês, Bernard Comment. Considerado um dos maiores autores italianos contemporâneos, Tabucchi escreveu obras como Afirma Pereira e O Tempo Envelhece Depressa. Autor de mais de 20 livros traduzidos para quase 40 idiomas, o romancista, professor universitário e ensaísta era tradutor da obra do escritor português Fernando Pessoa para o italiano e um de seus principais divulgadores.

Monday, February 20, 2012

Poeminha

CORRIDA
Corra
Corra menino
Corra menino na busca do saber
Senão restará para você
Ser apenas mais um zero
No mundo dos nadas.

Friday, February 10, 2012

Poeminha- Gaiola

GAIOLA

Gaiola não é hotel.
Por mais que o serviço seja bom, falta o principal:
A liberdade só conseguida nos céus.
Homens, abram as portinholas e consintam aos pássaros
O direito de viver sem limites.

Thursday, February 09, 2012

Miniconto- Intranquilo

INTRANQUILO
Ele saiu de casa naquela tarde completamente intranquilo, estando seu cérebro em chamas. Repetia para si: “hoje eu mato alguém, hoje eu mato alguém.” Deixou o automóvel na garagem e seguiu caminhando em direção à cidade. Na cabeça usava um boné branco e na mão direita um revólver calibre 38, carregado com cinco projéteis. No caminho cumprimentou bodes e galinhas, patos não havia. Duas centenas de metros antes da cidade ele empacou. Sentou-se numa pedra e ficou por alguns minutos pensativo, até mesmo sem cuspir. Então deu um grito pavoroso  que acordou os japoneses, esbugalhou os olhos e atirou na própria cabeça. Em casa, sua mulher sentiu o coração palpitar quando viu os comprimidos do marido doente jogados no lixo.

POEMINHA- CERTEZA

CERTEZA
A vida corre
A morte nos espera
Somos ínfimas partículas
Filhas longínquas da grande explosão
Então mesmo sabendo
O que nos aguarda no fim
Vivemos com pressa
Como se a morte
Fedorenta e fria
Não fosse nos esperar.

POEMINHA- LOUCURA

LOUCURA

Vivemos dentro sociedade uma tempestade de
Drogas
Pressa
Trânsito maluco
Desamor
Interesses
Crueldade
Corrupção
Desconfiança
Stress
Depressão
O melhor a fazer é desligar o motor do mundo
E criar o seu próprio modo de viver.

POEMINHA- RECADO


RECADO
Querida,
receba o meu coração através desta andorinha.
Vai embrulhado em papel pardo.
Faça dele o que quiser,
pois morto já estou.
PS: Morri de saudade.

POEMINHA- O CIRCO


O CIRCO

Era um circo pobrezinho,
De parcos recursos e lonas rasgadas.
Não tinha animais em jaulas, nem mesmo um velho leão.
Sobrevivia de espetáculos de lutas e palhaçadas,
Mas era um circo alegre.
Porém um dia o circo pobre
Além de pobre ficou triste:
Seu artista principal foi morto num bordel.
Meus olhinhos de criança
Viram quando saiu o cortejo,
Acompanhado por dois palhaços
E nenhuma multidão.

Saturday, January 28, 2012

Poeminha- Boa alma


BOA ALMA

Ela entrou pelo portão principal do cemitério
E foi aplaudida por milhares de almas antigas
Fez correr do seu caminho espíritos maus
E afastou alguns fantasmas pregadores de peças
Foi então deitar-se tranquilamente no seu esquife acolchoado
Enquanto ao redor os vivos choravam.

Poeminha- Mão amiga


MÃO AMIGA

O abismo estava lá esperando por mim
Mas apareceu uma mão amiga
E pensei estar salvo

Mas qual nada
Era uma grande mão amiga da onça
Com garras afiadas

O tombo foi grande
Mas a dor maior
Foi descobrir tamanha falsidade

Na convalescença do espírito
Refleti sobre uma verdade doída:
Os amigos verdadeiros
São mais raros que os mais belos diamantes.


Friday, January 27, 2012

Miniconto- O buraco

O BURACO
No lugar não havia placa de aviso. Um enorme perigo para os transeuntes que não tinham o hábito de olhar para o chão. Um cidadão distraído com seus pensamentos caiu então no buraco. Gritou ele por socorro durante muitas horas, até que finalmente foi ouvido. Vieram os funcionários da prefeitura e encheram o buraco de pedras e terra. O cidadão distraído não gritou mais.

Miniconto- Esqueletos

ESQUELETOS
Meia-noite. Uma lua de prata brilhava no céu estrelado. Pisava eu com meus sapatos quarenta e dois por uma estradinha deserta, rumando para casa. O vento soprava manso, mas mesmo assim mexia com pequenos arbustos. Tudo calmo na noite, nem um pio da coruja se ouvia. Nisso pensava quando ouvi passos atrás de mim, só ouvidos por causa do silêncio absoluto, tão leves eram. Parei para tentar ver quem caminhava junto comigo naquele lugar ermo, ainda mais por aquelas altas horas. E vi: cinco esqueletos completos estavam lá e caminhavam em fila indiana na minha direção. Usavam chapéus, riam e batiam seus dentinhos. Como nunca acreditei em fantasmas, segui o meu caminho sem pressa. Não parei mais, mas podia os ouvir eles dizendo: espera, espera aí! Chegando em casa soltei da coleira os meus quatro cachorros. Saíram como loucos; olhei para a estradinha e ainda consegui ver um dos esqueletos correndo com uma perna só.

Poeminha- Moça feia

MOÇA FEIA
Quando jovem namorei Luísa
Luísa era uma moça feia
Mas tinha ela o cheiro das rosas
E o beijo mais doce que conheci


Acabei abandonando Luísa
Por uma formosura
E muito me arrependi
Deste ato impensado


Pois passado trinta anos
Não me esqueci da moça feia
Que naqueles dias ensolarados
Fez-me tão feliz.

Poeminha- Quando um amigo se vai

Quando um amigo se vai
Quando um amigo se vai
É como uma estrela que não brilha mais
Mesmo entendendo
E não querendo
A gente sofre
Mais doloroso ainda
É quando ele parte
Assim de repente
Surpreendendo a sua gente
E deixando tantos sonhos pelo caminho.

Poeminha- Quem já foi não sente o perfume

QUEM JÁ FOI NÃO SENTE O PERFUME
O morto aí está
Não fala nada
Não responde perguntas
Hoje você trouxe flores para o velório
Belas flores por sinal
Agora uma pergunta:
Quando ele estava entre nós
Você também lhe dava flores?

Poeminha- Medo

MEDO
Eu já tive medo da escuridão
Por não saber onde pisar
Eu já tive medo de temporais
Que com seus ventos fortes derrubavam árvores
Eu já tive medo de cemitérios
E dos seus pseudos fantasmas
Na verdade de quase tudo eu já tive medo
Todos esses medo ficaram no passado
E hoje só me amedronta
A maldade que envolve o coração dos homens.

Miniconto- Os pistoleiros


OS PISTOLEIROS
Lá nos cafundós do Mato Grosso, perto de onde o diabo perdeu suas cuecas, no final de uma estrada poeirenta e quase sempre vazia, moravam os irmãos Morais; Pedro 38, Paulo 35 e Batista 30. Eram solteiros e quando precisavam se aliviar iam até o bordel da Zefa, em Feliz Natal. Os irmãos Moraes criavam porcos e matavam gente. Mais matavam gente que criavam porcos. Matavam gente perto, matavam gente longe. O importante era a paga. Quem morria só interessava pelo preço. Faziam tudo bem feito; a justiça nunca triscou neles. Mais de trinta estavam na conta, bons lucros às funerárias. Não tinham sentimentos, pouco se importavam em deixar filhos sem pai. Eram pessoas rudes e sem bons sentimentos. A vida era assim; um serviço e depois meses de armas guardadas. O tempo corre... Certo dia chegou naqueles confins uma bela moça morena. Tinha brilho, belo sorriso e pernas roliças. Era quase noite e pediu um lugar para ficar. Com boas intenções eles acolheram a mocinha, acredite quem quiser. Foi um a noite e tanto. Rolou muito sexo e cachaça entre o quarteto. Todos dormiram embriagados e exaustos. Quando clareou o dia ela foi embora antes mesmo dos irmãos acordarem. Dela não mais se soube. Os irmãos?  Depois de alguns dias morreram os três de pinto podre.

Miniconto- O encontro


O ENCONTRO
Esta é a curta história de Nice, uma doce bombinha faceira e formosa que apressadamente marcou um encontro com um pombo galã após conhecê-lo pela internet. Embora avisada pelos familiares dos perigos de encontros assim, nem deu bola e foi. Usou seu melhor perfume e carregou na maquiagem. O local combinado para o encontro foi um casarão abandonado na Vila Dores. Chegaram ao local e foram para o sobrado. Já nas primeiras carícias  o tal pombo mostrou sua verdadeira face. Ela ficou apavorada quando o dito mostrou suas garras. Na verdade não era pombo, mas sim um gavião disfarçado. Azar da pobre pombinha que foi literalmente comida no primeiro encontro. Restaram da Nice penas e sua 
Necessaire.

Miniconto- Canário de estimação


CANÁRIO DE ESTIMAÇÃO
Seu João Maria tinha um canário, o Dodô, que trinava maravilhosamente, sempre alegria da casa. Era o seu xodó. Num domingo em que João Maria foi à igreja, o gato da mulher deu um jeito e pegou o canário. Penas, sobraram penas e nada mais. Seu João até pensou em matar o gato, mas não. Fechou ele na gaiola e disse:
- Agora, canta desgraçado! Você só irá sair daí quando cantar igual ao meu canarinho.
O gato murchou.

Miniconto- A pedra


A PEDRA
Havia uma grande pedra no alto do morro que dava a impressão que logo iria cair. Um especialista foi chamado e disse: “não há perigo, está firme, não cai, eu garanto.” Nisso uma mosca pousou na pedra, a dita firme rolou e achatou o especialista. Ele ficou bem amassadinho.

Miniconto- A fila


A FILA
A fila ultrapassava cinco quarteirões. O passante curioso perguntou para o último dos esperançosos:
-Fila para emprego?
-Não. Estamos pegando senha para no futuro entrarmos no paraíso.
O passante ficou atônito:
- É grátis?
-Não! Duzentos reais.
-Bem caro- falou o passante. - Acho que irei aguardar pela fila do purgatório. Espero que seja mais em conta. 


Tuesday, December 20, 2011

Poeminhas

CÃO BRAVO 
Naquela casa tinha uma placa 
De cuidado com o cão bravo 
Mas depois algumas desavenças entre vizinhos 
Descobriu-se que o cão não era de nada 
E que quem mordia mesmo era o seu dono.

O VENTO E O AVARENTO
Tem o vento 
Tem o avarento
O vento carrega tudo 
O avarento guarda tudo 
O vento sopra 
Fraco 
Médio
Forte 
Já o avarento assopra 
Sempre forte 
Quando é para economizar vela.



Monday, December 05, 2011

Poeminha: Imundície

Eu sei que há bons políticos
Mas eles são tão poucos
Quando chegam no castelo
O sistema os engole
É como jogar uma linda rosa
Num tonel de bosta
Seu perfume e beleza
Somem ante tanta imundície.

Sunday, November 20, 2011

O cão

Não creio no cão
Mas se existe o dito
Anda ele trepado num palco
Empunhando um microfone
Contando lorotas
E assustando com o fogo infernal
Uma multidão de coelhinhos sem discernimento.

Sunday, November 06, 2011

"Quando o dinheiro vale mais que o saber,espere pelo pior."

O meu bolso primeiro

Faz tempo não creio mais em políticos
Pois sai Pedro entra Paulo pouco muda
Ou se assim quiser podemos dizer que vemos apenas alguma mudança
No perfil dos outrora porcos magros.


Meus sonhos

Tenho sonhos seguidos
E todos eles terminam do mesmo jeito
Eu caindo da cama.

Wednesday, November 02, 2011

A vida do ídolo

O ídolo olha pela janela do hotel
Na rua embaixo centenas gritam seu nome
Acenam e suspiram
Ele é quase um Deus
Mas o ídolo adorado
Nadando em dinheiro e fama
Mas sem ter paz
Aspira pelo nariz
O pó branco perigoso
Nesta busca incessante
Tentando encontrar nele algo que a vida não lhe deu.

Wednesday, October 19, 2011

Cãozinho machucado

Como é triste ver um cãozinho
Tentando andar com uma perna quebrada
Ergue-se valente e volta a tombar
Olhando às gentes com seus olhos tristes
Mas ainda bem que em meio aos indiferentes
Há sempre um coração bondoso que o acolhe
E aplaca seu sofrimento.

Inconformado

Meu pensar é denso e
Carregado de indignações
A depressão montada no desalento
Cerca o meu dia turbulento
Mas não me entrego de jeito nenhum
Pois nasci assim
Meio doce meio amargo
Eternamente inconformado com a ignorância.

Wednesday, October 05, 2011

Que paraíso?

Garganteiam nos palanques midiáticos
Que vivemos num paraíso
Mentiras deslavadas de mentirosos contumazes
Que há muito perderam suas vergonhas
Pois certo é que num paraíso
Não se veria nenhuma mãe
Implorando por hospitais 
Que atendam seu filho.

Quem diria

Não te conheço mais
Ou na verdade nunca te conheci
Amigo não és 
Talvez apenas um colega
Pois percebo agora
Que teu amor ao dinheiro é maior que nossa amizade
Mas gostaria de saber
Se na hora da dor
Vais chorar no ombro de um maço de notas de cem?

Thursday, September 22, 2011

Remorsos

Quando lembro que cometi maldades
O remorso me apunhala
Mas não posso parar para lamentar
O mal foi feito e não há volta
Posso sim fazer o bem em dobro
Pra sentir a dor sossegar um pouco.

Incógnita

Até quando viverei?
O nosso tempo de vida é uma incógnita
Sendo assim nada resta senão amar muito.


Avarento

O avarento constrói seu castelo
Para se esconder do mundo
Passa dia e noite
Só pensando na fortuna que aumenta
E quanto mais cresce sua riqueza
Na mesma proporção ele fica mais só
Os parentes alhures anseiam por sua morte
Antes que o dinheiro fique mofado.



Desencanto

Ando sempre buscando novas motivações
Subtraindo alguns desejos
Buscando novas fontes de alegria
Pois muitas de outrora
Perderam sua graça
Não há mais encanto
Perdeu o brilho e o romantismo
O esporte das multidões.

Monday, September 05, 2011

Miniconto- A Cirurgia

Depois da cirurgia cerebral ele se encontra deitado na cama de ferro, imóvel sobre alvos lençóis. De hora em hora uma enfermeira vem para ver como ele se encontra.Observa sua pressão e sai.Na parede ,solitário, um quadro da Santa Ceia faz companhia ao homem que dorme sedado.Sobre o criado mudo não há nada,nem mesmo um copo ou uma revista qualquer.O soro desce em lentas gotas e o rosto do enfermo aos poucos ganha cor.Lá fora, entre nuvens, aparecem pedaços do azul do céu.No canto esquerdo do quatro está largado um pequeno sofá marrom,que aguarda para acolher uma visita qualquer.Já faz quatro horas que a operação foi realizada; o homem abre os olhos e se mexe um pouco.A enfermeira chega,ele pede- “Onde estou?”Ela fazendo um olhar de mãe diz que ele está no Hospital Samaritano,sofreu uma cirurgia para extirpar um pequeno tumor no cérebro e que correu tudo bem.-“Tudo bem,nada,diz ele.Sou encanador,vim até aqui apenas para consertar um vazamento,resvalei e acabei caindo no banheiro.Nunca tive tumor algum,salvo minha mulher.E agora me acontece isso?”